O STJ julgou, na sessão de ontem (26/4), o Tema 1.182/STJ, no qual se discute (i) se é possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL; e (ii) se, para essa exclusão, deve, ou não, ser exigida do contribuinte a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimento econômico.
Na oportunidade, a 1ª Seção fixou as seguintes teses:
A construção das teses, no entanto, suscitou diversas discussões, especificamente quanto à possibilidade de a Receita Federal fiscalizar o destino das subvenções.
Além disso, persistem dúvidas sobre a validade do julgamento de ontem, já que foi proferida, pelo Ministro André Mendonça do STF, nos autos do Tema 843 da repercussão geral, decisão cautelar que suspendeu a eficácia do julgamento do STJ.
Iniciada a votação, o Ministro Benedito Gonçalves, Relator, votou no sentido de que a questão de não inclusão do crédito presumido de ICMS da base do IRPJ e da CSLL não pode ser aplicada aos demais benefícios fiscais de desoneração (item 1 da tese).
Assim, prestigiou o entendimento da 2ª Turma sobre a matéria, mas preservou a possibilidade de exclusão das subvenções do IRPJ e da CSLL, desde que observados os requisitos previstos na legislação.
O crédito presumido, segundo o Relator, teria peculiaridades que o afastam dos demais benefícios. Isso porque, a atribuição de crédito presumido ao contribuinte afasta o efeito da recuperação. Já os demais benefícios, segundo o Relator, poderão ser recuperados por sistemática própria.
Segundo ele, para exclusão dos benefícios fiscais do ICMS, não deve ser exigida a demonstração da concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público (item 2 da tese).
O Ministro também acolheu a proposição do Ministro Herman Benjamin, segundo o qual a dispensa de comprovação da concessão como estímulo à implantação não pode obstar que a Receita Federal faça lançamentos de IRPJ e a CSLL caso comprove que a Empresa se utilizou dos benefícios para finalidades estranhas à referida implantação (item 3 da tese).
Após o voto de outros 4 Ministros acompanhando o Relator, votou a Ministra Regina Helena Costa, no que fundamentou que há dois problemas na delimitação do tema: (i) o primeiro acerca da inserção da imunidade no rol de incentivos fiscais, uma vez que, segundo a Ministra, não se trata de benefício fiscal concedido por pessoa política, e sim fixado pela Constituição Federal, de maneira que seria competência de o STF analisar a matéria; (ii) o segundo, o de que deveria também ser retirada do Repetitivo a expressão “entre outros”, pois acabaria ensejando em insegurança jurídica.
Criticou o fato de que a Seção estaria decidindo um tema com indevida extensão a várias modalidades de benefícios, de maneira que exigiria um maior amadurecimento.
Seguido isso, votou para acompanhar o Relator ressalvando o seu entendimento pessoal de que a inclusão dos benefícios de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL fere o pacto federativo.
Os demais Ministros do Plenário acompanharam integralmente o Relator e, por maioria, acataram a sugestão da Ministra Regina Helena acerca da exclusão da imunidade.
Não foi excluída a expressão “entre outros”, pois, conforme fundamentou o Ministro Mauro Campbell, a criatividade dos Estados enseja em inúmeros benefícios de ICMS, de maneira que a tese deveria sim ser geral.
O principal ponto que os contribuintes questionam é se precisariam, ou não, demonstrar que as reduções e isenções a eles concedidas foram investidas na implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.
É possível concluir que os Ministros mantiveram a aplicação do pacto federativo, que vem sendo evocado com frequência em decisões da Corte favoráveis aos contribuintes, para os créditos presumidos e outorgados de ICMS, de modo que não seria necessário atender aos requisitos legais.
Da leitura do item 2 da tese fixada pela Seção, entende-se que tal comprovação não é necessária. Inclusive, a 2ª Turma já havia afastado a comprovação, quando do julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial 1.968.755, quando foi esclarecido que a Lei Complementar 160/2017 equiparou todos os incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de ICMS a subvenções para investimento, de modo que é “desnecessário comprovar que referidas benesses foram estabelecidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos”.
Por outro lado, deve-se alertar que, caso a Receita Federal inicie procedimento de fiscalização e conclua que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados pelo contribuinte para “finalidade estranha” à garantia da viabilidade do empreendimento econômico, poderá fazer o lançamento complementar do IRPJ e da CSLL.
A expressão “finalidade estranha”, além de dúvidas, enseja receio nos contribuintes de que a Receita, em interpretação restritiva, proceda a impor condições para a dedução do IRPJ e da CSLL em desconsideração ao ambiente amplo no que toca à diversificação de aplicações de capital e aos modelos operacionais utilizados pelos contribuintes na consecução e expansão de suas atividades.
De toda forma, cabem ainda embargos de declaração contra o acórdão do STJ, os quais podem ter boas perspectivas de aclarar esse cenário incerto, sobretudo porque, no decorrer do julgamento, a Ministra Regina Helena manifestou que a Seção acabou decidindo um tema com indevida extensão e sem o necessário amadurecimento do debate.
É questionável, ainda, a validade daquele julgamento.
Pouco antes do seu início, o Ministro André atendeu ao pedido da Associação Brasileira do Agronegócio, e, em suas razões de decidir, apontou que o julgamento do STJ encontra relação de prejudicialidade com o Tema 843/STF, de maneira que se fosse deliberado o Tema 1.182/STJ antes do Tema 843/STF, principalmente caso exista dissonância na fundamentação ou no resultado entre eles, poderá promover insegurança jurídica no sistema de precedentes obrigatórios brasileiro. Assim, determinou a suspensão do julgamento do STJ e, caso já concluso, a suspensão de sua eficácia.
A liminar foi pautada para julgamento de referendo pelo Plenário do STF, que deverá ocorrer em sessão virtual que ocorrerá entre os dias 05/05/2023 e 12/05/2023, de maneira que caberá aos outros 9 Ministros integrantes da Corte validar ou não a decisão de Mendonça.
Após a notícia e a primeira sustentação oral, o julgamento foi temporariamente suspenso para os Ministros decidirem como proceder. Em seguida, os representantes dos contribuintes e da Fazenda foram reconvocados ao Plenário, no que foi noticiado que a Seção daria sim continuidade ao julgamento, a despeito da posição do STF.
Segundo o Presidente, Sérgio Kukina, a medida cautelar havia sido proferida após o julgamento ter sido iniciado, de maneira que poderia representar tão somente a sua eventual anulação.
Ainda, deve-se considerar que a liminar poderá ser referendada ou não pelo Plenário do STF.
O Tema 843/STF apresenta discussão semelhante à pautada pelo STJ. Nele, se discute a possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS/Cofins dos créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal.
Até o momento, o feito não tem previsão de pauta, não obstante o seu julgamento já tivesse sido iniciado no Plenário virtual, com manifestação dos 11 Ministros à época.
Havia voto do Relator, Marco Aurélio, para negar provimento ao recurso da União e fixar a seguinte tese: “Surge incompatível, com a Constituição Federal, a inclusão, na base de cálculo da Cofins e da contribuição ao PIS, de créditos presumidos do ICMS”. Votaram com o Relator: Rosa Weber, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Roberto Barroso (Maioria do Plenário).
Divergiu o Ministro Alexandre de Moraes para fixar tese contrária: “Os valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal integram a base de cálculo do PIS e da Cofins”. Acompanharam a divergência os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Nunes Marques e Luiz Fux (total de 5 Ministros).
Assim, ambos os temas discutem se o pacto federativo permite ou não que o ente central tribute os valores usufruídos pelo contribuinte a título de benefício fiscal, concedido pelo ente subnacional.
Acompanhando de perto a discussão, o schneider, pugliese, acompanhará a publicação do acórdão para que seja analisada eventual limitação da classificação de benefícios fiscais como subvenção, dado o entendimento do STJ no Tema Repetitivo em referência.
Em razão da relevância da matéria, o escritório está acompanhando de perto os leading cases no STF e no STJ, e se mantém à disposição para fazer quaisquer esclarecimentos que se façam necessários, bem como para avaliar estratégias judiciais e administrativas a serem adotadas em razão dos julgamentos.