Em 12/01/2023 foi publicada a Medida Provisória nº 1.159/2023, que promoveu relevantes alterações sobre o crédito decorrente do indébito tributário em razão do julgamento do RE 574.706 no Supremo Tribunal Federal, no qual foi reafirmado que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é o destacado das notas fiscais.
Extrai-se da Medida Provisória que o Governo federal está, de um lado, se adequando ao julgamento do Tema 69 no STF em relação a qual ICMS deve ser excluído da base de cálculo das mencionadas Contribuições, visando encerrar a litigiosidade e fortalecer a segurança jurídica. Contudo, ao mesmo tempo, foi criada limitação ao direito de crédito de PIS/COFINS, matéria não analisada na Suprema Corte.
De acordo com o anúncio na oportunidade da publicação da Medida Provisória, o Ministério da Fazenda indicou que, considerando que as contribuições ao PIS/COFINS não serão calculadas sobre o ICMS, consequentemente os créditos também não incidirão sobre o valor do imposto estadual constante do preço das operações de aquisição.
Assim, verifica-se que a Medida Provisória pretende impedir a inclusão do ICMS incidente na aquisição de bens na base de cálculo dos créditos de PIS/COFINS, observada a exigência de anterioridade nonagesimal (a partir de 01/05/2023). Na prática, haverá uma redução no valor dos créditos e, por conseguinte, um aumento do valor devido pelos contribuintes.
A MP, neste ponto, viola frontalmente a decisão do STF, pois, com a exclusão do ICMS da base dos créditos de PIS e COFINS, significa dizer que a União pretende compensar a perda e receber como tributo, de modo transverso, o valor do ICMS que foi retirado da base dos débitos das Contribuições.
Se o STF determinou a exclusão do ICMS da base do PIS e da COFINS, agora a União recupera este valor, indiretamente, pelo recorte do ICMS da base do crédito, o que representa profundo desrespeito à decisão tomada pela Suprema Corte.
A MP torna sem eficácia a decisão do STF.
Além disso, não há correlação lógica entre a exclusão do ICMS da base dos débitos do PIS/COFINS e a exclusão do imposto estadual da base dos créditos destas contribuições.
Uma coisa não implica a outra.
O STF declarou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base dos débitos do PIS e da COFINS porque o imposto estadual não caracteriza receita dos contribuintes.
O crédito do PIS e da COFINS, por outro lado, na sistemática não-cumulativa construída pelas Leis nºs 10.637/2022 e 10.833/2003, incide, como regra geral, sobre o valor do bem ou do serviço adquirido para revenda ou como insumo. Ou seja, o crédito é calculado sobre o preço do bem ou do serviço adquirido. Não se confunde, portanto, com o conceito de receita. São coisas distintas que não se implicam mutuamente.
Logo, a MP, ao partir do pressuposto de que a decisão do STF de excluir o valor do ICMS do débito do PIS e COFINS implica necessariamente a exclusão do imposto estadual dos créditos das Contribuições, incorre em evidente falácia que resulta na completa falta de razoabilidade e proporcionalidade da medida.
Mais do que isso, a MP, rigorosamente falando, reduz a eficácia do princípio da não-cumulatividade insculpido no artigo 195, § 12 da CRFB/88, malferindo-o, porque faz incidir o direito ao crédito apenas sobre uma parcela do valor da aquisição, ou seja, do preço, violando o conteúdo mínimo da regra constitucional, que é impedir a repercussão do tributo em cascata, como ressaltou o Ministro Toffoli, no RE 841.979 (caso Unilever).
Também vale destacar que, muito embora a Medida Provisória preveja a observância ao princípio da anterioridade nonagesimal, outra questão refere-se a situações em que as aquisições podem ter ocorrido antes da produção de efeitos da medida provisória que ensejam a tomada de crédito de forma extemporânea ou mesmo fracionada, como na depreciação, após essa data.
Nesses casos, é possível argumentar que a regra a ser aplicada é a do fato gerador, ou seja, a norma vigente à época da aquisição do bem ou mercadoria, de forma que a restrição somente poderia ser aplicada para aquisições posteriores à vigência da Medida Provisória, uma vez que haveria uma mudança da própria forma de apuração do tributo que não pode retroagir para alcançar fatos geradores anteriores à sua entrada em vigor e produção de efeitos.
Fora de dúvida é também o fato de que a MP, no ponto em que recorta o direito do crédito, não apresenta relevância nem urgência.
Consideramos, portanto, haver fortes argumentos para afastar a restrição ao crédito de PIS e COFINS instituído invalidamente pela MP 1.159/2023, de modo que o escritório schneider, pugliese, se mantém à disposição para traçar estratégias judiciais ou administrativas a serem adotadas em função da nova legislação.